- Nº 2041 (2013/01/10)
Depoimento de David Pestieau
no XIX Congresso do PCP *

<font color=0093dd>O nosso desafio é a luta de massas</font>

Temas

A Bélgica, como toda a Europa, está confrontada com a crise. Os seus efeitos começam agora a sentir-se com maior gravidade, talvez com algum atraso em relação aos países do Sul da Europa.

O país está em recessão. Após o primeiro plano de austeridade, o governo acaba de aprovar um segundo e assistimos a uma grande vaga de reestruturações industriais. Só nos últimos meses encerraram grandes unidades como a fábrica da Ford, em Genk, e a siderurgia da ArcelorMittal, em Liège.

No sentido de preparar a organização da luta nesta fase, o nosso partido realizou, há três anos, uma conferência nacional sobre o tema da crise, na qual contámos com a participação de um camarada do PCP.

Na preparação das lutas, que nos coloca grandes desafios, temos realizado um grande trabalho de explicação sobre a dimensão europeia da crise. O nosso presidente, Peter Mertens, escreveu um livro intitulado «Como se atrevem eles?», que teve um grande acolhimento, tornando-se no livro político mais vendido na Bélgica nos últimos 20 anos.

Mais de 25 mil pessoas compraram o livro, que expõe as razões da crise no contexto europeu, analisando a situação em vários países, incluindo Portugal. Realizamos cerca de 130 sessões de apresentação desta obra, e podemos dizer que o debate sobre a crise penetrou em amplas camadas da população.

Consideramos que é preciso elevar a consciência política mas, naturalmente, ela tem de ser acompanhada pela mobilização para a luta social. Neste aspecto é de destacar a grande greve geral de 30 de Janeiro deste ano. Estamos a preparar uma segunda grande mobilização, ao mesmo tempo que, como em vários outros países, se trava um debate no movimento sindical entre a corrente que procura a conciliação com o capital e a corrente de classe que quer desenvolver a luta contra as reestruturações e os programas de austeridade. Este é um grande desafio que temos nos próximos meses.

Entretanto, no plano político, houve desenvolvimentos importantes, que criaram uma conjuntura particular na Bélgica. Hoje, temos de facto um governo de unidade nacional, em que participam os três partidos tradicionais (sociais- democratas, democratas cristãos e liberais). É este governo que está a impor a austeridade à população. Mas há outra corrente política ainda mais agressiva, que representa sobretudo o grande patronato do Norte, e que quer destruir os sindicatos e a democracia por via da divisão do país, como é o caso do Partido Nacionalista Flamengo que tem vindo a ganhar terreno.

Portanto, além da crise económica, existe também uma crise política que se expressa na divisão das classes dominantes em duas correntes.

Um partido a crescer

Quanto ao nosso partido, temos feito um esforço para crescer. Nos últimos dez anos, passámos de 1500 para 5600 militantes, alargámos o trabalho nas empresas e nos bairros e nas últimas eleições municipais alcançámos, pela primeira vez, um resultado significativo nas grandes cidades, recolhendo quase 146 mil votos.

Já antes tínhamos conselheiros municipais em pequenas e médias cidades. Agora, por exemplo, na Antuérpia, que é a segunda maior cidade do país, o PTB obteve oito por cento dos votos, tornando-se na quarta força política da cidade. Também na região de Liège, pela primeira vez, além do próprio município de Liège, em que elegemos dois conselheiros, obtivemos ainda importantes resultados em várias cidades, que variaram entre sete e 14 por cento. Em alguns municípios, caso de Seraing e de Herstal, tornámo-nos a segunda força política, a seguir aos sociais-democratas.

Elegemos igualmente pela primeira vez conselheiros nas cidades de Charleroi, Mons e em dois municípios de Bruxelas. Isto significa que hoje estamos presentes na maior parte das grandes cidades, o que corresponde aos objectivos que fixámos, em 2008, no VIII Congresso do nosso partido. Depois de termos progredido ao nível municipal, pretendemos avançar também ao nível nacional, nas eleições legislativas de 2014.

Estes resultados reforçaram a voz do nosso partido no plano da política nacional. Os sociais-democratas, que são a primeira força no Sul do país, estão sob pressão devido ao reforço eleitoral do PTB. Sentem que têm um verdadeiro concorrente à esquerda. Para contrariar esta tendência recorrem a várias tácticas, a última das quais foi tentarem apresentar o PTB como um partido não democrático. Mas a manobra falhou. As pessoas perceberam que a acusação era infundada e se devia à perda de influência eleitoral.

No Norte, com o êxito alcançado na Antuérpia, o PTB foi a única força de esquerda que cresceu, em contraposição ao partido nacionalista de direita que tem vindo a aumentar o seu domínio ideológico. Isto significa que muitas pessoas de esquerda vêem o PTB como o pólo de resistência contra a deriva para a direita, o que nos coloca grandes desafios para os próximos anos.

Na Bélgica, a luta tem de se desenvolver em defesa das conquistas sociais, mas também pela manutenção da unidade do país. Sabemos que o grande patronato do Norte quer a cisão para destruir rapidamente a Segurança Social, os direitos sociais, os sindicatos.

Por isso, para nós é muito importante estarmos presentes no Congresso do PCP, já que temos muito a aprender com um partido que possuiu uma tão grande experiência no trabalho de massas e de luta de massas. Pensamos que, acima dos êxitos eleitorais, é através da luta de massas que poderemos alterar a correlação de forças e a consciência das pessoas.

* Membro do Bureau Político do Partido do Trabalho da Bélgica, responsável do Departamento de Estudos e director do jornal «Solidaire»